quinta-feira, 3 de abril de 2014

Amadas guitarras

Nesses tempos loucos que vivemos, lembrei de como comprei minha Fender..a primeira e única que tenho. E que se encontra hoje enfiada em um armário.  Aqui o motivo. http://portalfernandomedeiros.blogspot.com.br/2014/02/luthiers.html

Como nada acontecia musicalmente, por uma certa pressão da família, consegui emprego no banco Bradesco.
7 meses depois, no final de 1977 pedi demissão. Tinha entrado para o grupo semi-profissional, Hydrante. Uma banda de rock com material próprio e o meu argumento para sair fora do banco. Seria um mínimo de resposta pra minha família...o banco bem ou mal tava me dando algum dinheiro...mas enfim. Pedi demissão.

Com o que recebi, uma mixaria, juntei ao que consegui vendendo minha aparelhagem de som. Queria comprar uma guitarra importada e além de que, precisava de uma guitarra nova pois a minha Giannini Gemini estava no fim...até de cobaia a fizeram...mas deixa quieto que isso aqui não é lugar de contar os podres. 

Vi no jornal um cara anunciando uma Gibson SG Standard 1973, por um preço sensacional..8 mil..eu tava com a grana. Corri lá. Era um americano que tinha acabado de chegar, nem cara de guitarrista tinha e tava querendo vender a guitarra. Linda, novinha..levei na hora. Ainda veio com um slide e uma correia meio chamativa, estilosa...meio feminina, cheia de brilhos...o cara devia gostar de Glitter rock.

Não me saía da cabeça que eu queria uma Fender Stratocaster, então ficava sempre de olho nos classificados do Jornal do Brasil...que era o jornal que líamos em casa. No início de 79 apareceu um anúncio.

"Vendo Fender Stratocaster 1969 por 12 mil"

Tremi.. uma Stratocaster e ainda por cima vintage! Falei com meu pai que a compraria e venderia a Gibson...eu tinha certeza não seria difícil vender. E ele me emprestou o dinheiro.

Liguei pro cara e marquei de ir ver a guitarra. Estava um pouco grilado, porque eu sou meio pé atrás, que poderia não conseguir vender a Gibson e queria pagar o meu pai de qualquer jeito....então pensei..."vou levar a SG e ofereço em troca pro cara...se ele topar, eu só devolvo a grana e acabou o problema".
E fiz isso. Peguei a Gibson, botei os 12 mil no bolso e fui de ônibus para o Alto da Boa Vista...eu estava em Copacabana...seria uma boa caminhada!

Ele morava em um casarão daqueles que tem lá..mansões...tinha grana. Chegando, vi a Strato e me apaixonei na mesma hora. Ofereci a SG em troca e o cara me esnobou...me mostrou uma Les Paul Custon, por incrível que pareça meio feinha e que na realidade não me disse nada, porque eu não tinha interesse nenhum em Gibsons..tava é louco pra sair dali logo com a minha Strato e tocar nela em casa.
Bem, eu tinha a grana e a SG, dava pra esnobar um pouco também. Comprei minha sonhada Fender Stratocaster.

Imagine isso hoje. Alguém indo de ônibus de Copacabana até o Alto da Boa Vista, longe pra dedel, com uma Gibson e 12 mil no bolso...e depois voltando do mesmo jeito, com uma Gibson e uma Fender debaixo do braço...e sem medo praticamente nenhum. Realmente eram outros tempos.

Anunciei a Gibson por 17 mil, vendi por 15, paguei meu pai e ainda me sobrou um dinheirinho bom.
Da compra da Gibson, até o final com sua venda, foi o melhor negócio que fiz na vida...sou craque em perder dinheiro em minhas transações. Não foi a melhor escolha como profissão, mas continua sendo minha paixão e válvula de escape...quando a música é boa e posso tocar com liberdade. Fora isso, é tortura...insuportável, doentio e ridícula em termos de retorno financeiro.
Escolhas erradas, falta de visão, oportunidades jogadas fora, burrice, inveja, inimizades e falsas amizades...tudo isso leva ao fracasso.

Não existia volta...já tinha tirado carteira da OMB, do Sindicato...tava com a guitarra que eu queria..virei músico de verdade.
 

   

2 comentários:

  1. Muito legal tua história Fernando. Tu faz parte do time que não se "prostitui". Isto aí, passa aperto, sufoco, mas faz o que gosta. Quantos passam o dia em um emprego que não suportam para sobreviver? Ainda quando tem uma válvula de escape é outra história...eu me "prostituo" para sobreviver mas escrevo para ter prazer, rs....

    ResponderExcluir
  2. Obrigado, Anna Claudia..não sei bem o que te responder em relação a isso. Acho que abdiquei de ter uma vida normal...casar, ter filhos, um emprego certo... por alguns motivos, dentre eles a responsabilidade em constituir uma família...se bem que isso nunca foi um desejo real meu, mas também tem muito de romantismo com a profissão, me espelhar desde cedo nos ídolos que eu tinha, pois os achava o máximo mesmo alguns sendo total porra louca, falta de ambição, não ter muito amor por dinheiro e creio que principalmente porque me refugiava na música pra amenizar minhas carências, conflitos, fantasmas...sem contar é claro, que quando eu tocava me sentia mais seguro de mim e confiante, pois sempre recebia elogios...além de feliz, porque estava fazendo o que amava. Mas me prostituí e muito, pois tocar em churrascarias e outras porcarias, apenas pra ganhar algum, eu fiz muito...em troca eu recebia uma mixaria, dores no corpo, frustração e insatisfação emocional. Por causa disso, várias vezes pensei em largar a música, só que não sabia o que fazer e tinha certeza que seria mais infeliz ainda, pois como vc disse...a música pra mim também é uma válvula de escape, assim como escrever, o é pra você ;))

    ResponderExcluir